Poeta de Gaveta

UM HOMEM E SUA OBRA

Por Luiz Cláudio Jubilato

A mulher gera, geratriz.
O homem constrói, construtor.
Cada um conta sua história. Cada um carrega sua memória. Cada um provoca uma extensão de si.

Criar é uma aventura visceral, ancestral.

Sem fronteiras. Sem barreiras. Sem garras. Sem amarras.
Gerar ideia é angustiante. Estonteante. Estressante. Ofegante.
É como o parto de um filho.
Parir um filho é uma experiência pessoal. Única.

Criar tem o exato tamanho da imaginação.

E a imaginação não conhece limites. Nem prisões. Nem concessões.
Nutre-se de impressões, sensações, emoções, definições, indefinições, relações…
Alimenta-se de vozes, sons, imagens, experiências, consequências, incongruências…
Come a sanidade, a lógica, a dignidade, a acessibilidade, a verdade, a paridade…
Vive de sinestesias, anestesias, idiossincrasias, aleivosias…
É voar. Sem asas. Sem rumo. Sem destino. Sem atenção.

O parto é uma aventura reveladora.

Um filho é uma ideia, que transmutada em corpo.
Antes de nascer, já nasceu na imaginação do pai, nos medos e anseios da mãe.
Nossas digitais estão nos seus traços.
No seu sangue, nosso DNA, nossa história, nossos erros, nossa glória.
Como toda ideia, arrebenta paredes, dilacera as entranhas para existir.
Até que a luz, sempre a luz, vem nos informar suas formas.
O que era apenas pensado, agora é concreto.
Saiu de nós para ganhar o mundo…
e o mundo vai formá-lo, deformá-lo, transformá-lo, reformá-lo.
Com fórceps, alivia o percurso para se chegar à respiração, à oxigenação.
Sem fórceps, a tarefa é mais árdua, apertada, labiríntica, igualmente tensa, prazerosa, comovente.

A obra é um filho.

Um filho é uma obra… em constante mutação.
Uma metamorfose diária…
A cada olhar de um parente, complacente, indiferente, referente…
A cada visão de um inocente, um inconsequente, um sorridente, um sobrevivente…
Um revés a cada tentativa de explicação, de comemoração, de definição.
Rompe com nossas convicções.
Só é nossa enquanto a temos dentro de nós.
O que planejamos para ela perde o sentido quando as pessoas se apropriam dela.
Rompido o útero da imaginação, encontra as palavras, expressões, frases, orações… E silêncio.

Criar uma obra é parir um filho.

A obra toma forma à medida que começa a existir fora de nós.
Quando ganha o mundo… que a distorce, torce, entorse, estorce…
Ganha vida nos olhos dos outros, na sua entonação, na sua respiração, na sua convicção.
Parte de nós, essência de tudo.
Uma dor atroz, vivência em surto.
Mescla de amor, torpor, terror, ardor…
Uma obra é vísceras, sangue, estômago, intestino, cosmovisão, universal, atemporal…
O que a mata não é a faca, mas a indiferença.

** Luiz Claudio Jubilato é professor de Língua Portuguesa e Redação. É mantenedor do Criar – Sistema de Ensino de Língua Portuguesa. Email; luizclaudio@cursocriar.com.

O INFERNO SOMOS NÓS MESMOS

O mundo em mim. Fogo nas veias. Abismo na alma. Boca seca…

Vozes variadas. Vários tons. Gritos em profusão. Batalhas. Guerras. Nenhuma solução.

É inverno em mim. Folhas secas sem adubar o chão. Tempestade nos olhos. Deserto nas veias. Vida árida.

Lobo nas entranhas. Ideias nas montanhas. Grito sufocado. Abafado. Defasado.

Inferno em mim…

Tolice em si. Ignorei meus argumentos, pensamentos, sentimentos. Sentir, na verdade, é uma forma de saber…

Ciúme tolo. Marcar os outros. Minhas unhas alongadas. Ferro em brasa. Minha propriedade…

Amor. Dor. Extravasamento. Suor. Desejo. Tesão. Vulcão.

Inferno em mim…

Medo em mim. Medo em ti. Desespero em nós. Nós não desatados. Destinos embriagados.

O verme trasmuta minha seiva. O frio carcome minhas entranhas. Desprezo as minhas leis.

Inferno em mim…

Amordaçar a verdade. Trombetear a mentira. Falsidade. Nenhuma lealdade. Labirinto em mim.

Caminhos tortos. Soco nas palavras. Calamidade em mim. Restos de ti. Nenhum beijo. Nenhuma luz…

Braços inanimados. Nenhum abraço. Dança sem compasso. Sexo com odor. Cárie. Pobre dor.

Inferno em mim…

 

(LUIZ CLÁUDIO JUBILATO)

SOLIDÃO

Estar só, é ouvir as batidas do próprio coração.

Um homem está sozinho, quando depende de alguém para limpar sua bunda, limpar o seu catarro, escovar os seus dentes, vestir as suas roupas, enfiar a colher na sua boca, esperar a sua mastigação…

Um homem está só, quando torce desesperadamente pelo time do coração e é capaz de matar por ele nas derrotas e morrer por ele nas vitórias.

Um homem está só, quando os rabiscos que quer fazer deles poesia não mais despertam reação, porque ninguém os lê; quando os acordes de sua música não dizem mais nada, porque ninguém tem mais interesse em ouvi-la.

Um homem está sozinho, quando, trancafiado entre paredes, vive de acariciar o pênis, como se quisesse deseperado concretizar seus sonhos e ambições e tesões…

Um homem está sozinho, quando tem medo de ter medo; quando não tem medo de ter medo; quando a sudorese, a tremedeira, o coração saindo pela boca, o frio consumindo as estranhas, se escancaram na face apavorada.

Um homem não é mais homem, quando não é mais capaz de sentir, de ajudar, de se enternecer, de se amar, de amar, de se indignar, de pedir, de consertar, de desacertar, de perder a coerência, de ser coerente, de criticar, de descobrir, de se descobrir, de definir como se tudo coubesse numa camisa de força, tranfiando a espontaneidade, os resquícios de humanidade…

Um homem não é mais homem, quando mergulhado em si mesmo, não consegue mais se achar; quando o pecado o faz um deus que só dialoga consigo para poder perdoá- lo; quando o fanatismo o consome a ponto de destruí-lo internamente, externamente, para jamais reconhecer-se.

(Luiz Cláudio Jubilato – 30/06/2013)

 

 

CAMINHADA

E hoje começo, recomeço
me faço e me refaço
me lanço e me arremesso
no fim e no começo
me desfaço e me díluo
diminuo no passo e me concentro
Faço meu momento com ou sem sofrimento
e aprendo com o vento a não ter direção
faço do meu peito minha morada
lugar de caminhada, minha maior emoção
Pois sigo aquilo que vem de dentro
do intimo, das pequenas coisas
das frutas, das flores e dos espinhos
do fundo da alma, oceano adentro
onde no coração desse epicentro
se constrói e se refaz caminhos.
Luti Gonçalves

Por QUE NINGUÉM LÊ POESIA?

Por que ninguém lê poesias? Porque o poeta não tem razão, muito menos a solução, para coisas mundanas como acabar com a corrupção.
Por que ninguém lê poesia? Porque a claridade, a realidade, a obesidade não interessam ao poeta, mas as pessoas esperam que interceda por elas, quando chegar a hora certa.
Por que ninguém lê poesia ? Porque não interessam ao poeta, o preço da carne ou a verdade da lucidez. Interessam-lhe sim a cupidez , a loucura, a embriaguez.
Por que ninguém lê poesia? Porque a poesia não está na epiderme, mas no cerne de quem a vê. O leitor de hoje só olha pra fora tentando adivinhar o futuro; não pra dentro de si, pois sempre tem medo do escuro.
Por que ninguém lê poesia? Porque o leitor de hoje é um ser imediatista, quer ter nas mãos uma lista das obviedades que possa consultar.
Por que ninguém lê poesia? Porque o leitor procura na epiderme dela as belezas que pretende encontrar, porém poetar é muito mais complexo, significa usar várias máscaras na arte de manipular.
Por que ninguém lê poesia? Porque a poesia arrebenta com as convicções e é, por vezes, atemporal, porém os donos desse mundo louco trataram de fazê-la dispensável embotando o raciocínio para que acreditemos ser ele concreto e sempre atual.
Por que ninguém lê poesia? Porque o homem de hoje nada lê, prefere a rapidez da internet ou a repetição idiota da tevê.
Por que ninguém lê poesia? Porque nela existe divisão de classes, o leitor verá rimas ricas e rimas pobres, como também lerá versos simples e versos nobres. Essa diversidade tem sua explicação, acabar com a monotonia na diferenciação.
Por que ninguém lê poesia? Porque muita gente só quer diversão, porém a temática geralmente abordada estimula mais a reflexão.
Por que ninguém lê poesia? Porque o leitor mais apressado acredita que é obrigação do poeta falar apenas de amor. Ele não tem o direito e o dever de falar do que quer que seja ou seja lá quem for.
Prof. Luiz Cláudio Jubilato

MAIS QUE NADA

Contra tudo o que sinto na minha pele

Apesar das decepções que trago comigo

Com o esperma quente das noites de sexo

Risco meu coração com a crença de que os homens são bons

E apesar da sua ambivalencia, da sua eterna adolescência,

Vale a pena Viver.

Com os olhos presos no céu

Vejo figuras carimbadas nas nuvens.

Minha pele se arrepia

Já não sou mais criança

A menina que provoca minhas reações me faz perceber

Já não sou mais criança

Preciso parar para crescer

Não deveria mais ostentar ilusões

No entanto, elas insistem em m perseguir à noite, quando, suado, não consigo  dormir.

Ou na garatuja em que se transformaram meus versos, depois da minha consciência

De que existo, logo penso… Até quando for possível.

 

Luiz Cláudio Jubilato

ESTAR AQUI

NÃO SEI POETAR, mas, se soubesse, viveria intensamente a textura das palavras

e sua multiplicidade de máscaras, roupas, sons e tons…

NÃO SEI DANÇAR, mas, se soubesse, viveria as partes do corpo, como se redigisse um poema

ora sapateando para dar consistência às palavras, ora cantando para dar ritmo aos versos

ora rodopiando para envolver o leitor

NÃO SEI CANTAR, mas, se soubesse, usaria a voz para encantar as pessoas,

ora arrebatando-as com os sons graves, ora enlouquecendo-as com os tons agudos,

ora levando-as ao delírio com a melodia.

NÃO SEI AMAR, mas, se soubesse, saberia poetar, dançar e cantar com espontaneidade

Não teria esse sapato impregnado de distâncias nem essa camisa suja de tempo

NÃO SEI MATAR, mas, se soubesse, carregaria a vida dentro de mim

só para arrancá-lá do peito a fórceps para jogá-la na vala comum de um mau poema

ou na temática tosca de um romance sem fim

PORQUE o problema maior não consiste em arrastar nas veias a vida e a morte

É estar aqui.

 

Luiz Cláudio Jubilato

OS HOMENS

Ainda que eu coma como eles, não sou um homem

Ainda que  eu queira como eles, não sou um homem

Ainda que eu mate como eles, não sou um homem

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Só serei um homem se eu tiver sucesso

Só serei um homem se eu puder mandar  sem ser contestado

Só serei um homem se eu tiver poder

 

Luiz Cláudio Jubilato

Eu vi um menino correndo

Eu vi um menino correndo… E vi também um adulto se escondendo. Era uma esquina de uma cidade como essa em que gente vive. Mas, que gente? Demente? Doente? Ausente? Não sabemos dela, de nada, nem de nós, nem de ninguém. Passamos o tempo correndo, porque corremos atrás do prejuízo. Quando o encontramos, não há mais o que fazer. Mais um ser humano perdido, invisível, desprezível, indizível. Impossível.

Eu vi um menino morrendo… E vi ‘otoridades’ se escondendo. Não vi gente indignada gritando. Menos um FEBEM, NINGUÉM. Roubo. De quem? O homem sem cabelos e sem desvelos morreu. Perdeu o dinheiro. O menino sem dinheiro e sem futuro. Perdeu a vida. Único bem. Único fardo. Estendido na calçada. O sangue pisado, fedido, talhado.

Ilustração: Obra de Antonio Veronese

Ilustração: Obra de Antonio Veronese

Eu vi um menino sofrendo… E todo mundo se escondendo. Do presente esquálido, de futuro maltrapilho. Nenhum grão de comida no inchado ventre vazio. Nenhuma perspectiva no imenso vazio da cidade. Sem pai, sem mãe, sem enredo. Vi também pessoas passando. Ninguém parando. Muito menos se importando. Gente do lixo. Lixo de gente. São apenas passantes. Seres itinerantes. Meros viajantes de uma morte sem fim.

Eu vi um menino matando. Eu vi a vida. Escapando no meio dos dedos. Manchando a calçada. O solitário, otário, caiu sangrando, cagando na entrada da feira. Seminu, comida de urubu, nas manchetes dos jornais. Não vi nenhum educador, somente o infrator, canino, sem seu destino, ainda menino, dentro do camburão. A sirene da polícia. A raiva entre os dentes. O soco no olho. Caolho. Indiferente. O buraco no ventre. As vísceras de fora. Agora. Na primeira página. Terror. Torpor. Horror.

Eu vi um menino cantando… Canções de guerra. Tinha a intenção de revirar a terra, para plantar. Menino sem futuro, menino no escuro; criança que nunca soube criançar. Menino velho, enrugado, seco decrépito que jamais soube brincar. Menino abandonado, viciado, violentado, fácil de cooptar. Sem identidade, sem verdade, sem vontade de continuar. Menino nervoso, raivoso, fácil de manobrar.

Eu vi um menino fumando… Um delinquente. Vi seu futuro demente, inconsequente. Não vi um padre trabalhando, nem um voluntário se esforçando, nem uma ‘otoridade’ planejando para fazê-lo parar. Vi o menino avião, extenuado, no chão, como na tela no cinema. Onde miséria é apenas estética, tema e não uma arena onde gente é comida de gente, cuja humanidade é fácil de arrancar. Filho do tráfico, do traficante, meliante, que o estado ajuda a forjar.

Eu vi um menino andando… Não vi o rumo. Vi-o se esgueirando entre os carros numa esquina. Uma esmola pelo amor de Deus, pelo amor dos seus que um dia ele pode matar. Só não vi ninguém se esforçando para fazer o seu futuro mudar. Eu vi um menino riquinho abaixando o vidro para vê-lo esmolar. Ele descobrirá facilmente que a morte é coisa rápida, que a vida daquele menino irá ceifar. Um presente sem futuro, cujo ódio a sociedade irá eliminar.

Eu vi a gritaria dos maus… Vi também o silêncio dos bons. Todos querem salvar o planeta para os seus filhos, mas quando irão salvar os seus filhos para o bem do planeta? Vi muitas bandeiras se agitando, vi muita gente falando, sem jamais olhar para o umbigo. Sem jamais olhar para o lado. Só olham para a frente, sem prestar atenção ao passado, acuado, sem história para contar. Vi a ignorância dos tolos. Mas, vi a omissão dos acomodados. Vi a predição dos resignados. Mas, vi também uma semente nos olhos dos indignados que, quem sabe, um dia, resolvam parar de falar para começar a trabalhar para mudar.

Luiz Cláudio Jubilato

Mestre

Já fui como uma muda.

Mas com cuidado e dedicação fui crescendo e me tornando uma planta.

Sempre tendo um mestre ao meu lado, me desviando das ervas daninhas e me podando.

Agora já posso dizer que sou uma árvore, forte, com as raízes bem presas ao chão.

O que posso dizer devo tudo isso aos mestres que passaram em minha vida, me orientando, me instruindo, me passando o seu conhecimento.

Esta é sem dúvida a carreira mais bela que alguém pode ter.

Porém a maioria de nós não valoriza, somos hipócritas, não sei dizer ao certo o porquê disso, talvez por conta da ingenuidade, talvez por conta da inexperiência.

Mas, vejo nós humanos como filhotes, entrando na escola, cheios de expectativas e na saída posso ver que já nos tornamos adultos.

Sei que ser professor não deve ser fácil, pois há tantas lições a serem passadas e ensinadas e poucas pessoas de mentes abertas realmente dispostas a aprender.

Me orgulho em dizer que sou uma pessoa de mente aberta.Consegui captar a essência de cada lição,fui incorporando o conhecimento,fui me aprimorando.

E posso dizer com todo o carinho,que as lições ensinadas por meus mestres me moldaram,fazem parte da composição que me tornei.

Muito obrigada pelo carinho, dedicação e paciência que tiveram comigo nesses anos todos.

Feliz dia do professor, o grande mestre da vida.

 

Michelle F. Zanin