Poeta de Gaveta

BOBO

(LUIZ CLÁUDIO JUBILATO – 25/07/59 – Dia do escritor)

 

Quando a escrita ainda garatuja pulava amarelinha brincava de polícia ladrão

a dona das verdades universais absolutas recitou pra molecada penugem debaixo do queixo

cara borrada irritada batom descorado perdigoto regras sobre como escrever bem

até hoje dentre todas as coisas boas más nem boas nem más não sei o que é isso também

disse que há grades chaves becos rodas gigantes corredores e chicotes grilhões carcereiros

tolo quis trancafiar Palavras entre a margem da folha do papel e o ponto final Cri nela

elas se libertaram das algemas Fizeram da minha pretensão carnaval Descri nas chibatas

a bruxa amarrotada de giz na mão esqueceu de vomitar em cima de mim Caminhos ninhos

Palavra é ser camaleônico tem mas não tem lugar muda esconde a cor Depois descarta a única visão

Pode escapar pode fazer viver e/ou matar e/ou roubar e/ou apunhalar e/ou correr

 

Palavra ora tormenta ora inventa ora se reinventa hora atormenta Tormenta

bate na mão retorce o pensamento estripa comove entorpece a emoção Solta a língua mão

língua solta língua de trapo língua de sogra língua de sapo língua Ferina Ferindo

escrita ela Palavra tem roupa letra som cara jeito de documento Será?

falada escapa pelos olhos foge pela boca como ares de vento espalha Será?

Palavra cachorro vira-latas não aceita coleira nem lei Será!

tempo período verso frase verso rima refrão

tempo põe ponto final reticências num vai pra lá sem limite

ponto é coisa ancestral ou ponto emocional ou interrogação

Antigamente riscava-se não com um dedo com a mão

apagava-se Palavra frase período com borracha não com toque de botão

 

Vírgula cria silêncio entre palavras frases períodos versos

interrogação cria o talvez, o sim, o não

parênteses encarceram pensamentos prisão

aspas dão status quo a qualquer comunicação

rima em “ão” é chute de bico entra no gol pobre mas é gol

palavra faca cega cabra cega Cega

substantivos adjetivos preposições verbos conjunções pronomes

agarram-se amarram-se devoram-se soltam-se sem cadeias nem amarras

Palavras têm olhos, pernas, fogem, abraçam, correm, comem, tramam, interagem

Palavras trazem bagagem Fiscalizadas enganam até raio “x”

 

sem um porquê rasga o indivíduo aos retalhos  planta o tal Estilo

meu corretor não corrige não sabe nada de nada bandido não quero correção

graças a deus à tela à falta de erudição Herro erro umano sou assim humano

não sei de línguas nem que Palavras bichos indomáveis derretem-nos sem precaver

por trás da máquina o homem programado programador piloto compilador

não conhece suscetibilidades subjetividades sensibilidades ataca a tecla feroz

aprendi a brincar com as Palavras errar de propósito sem propósito de qualquer jeito

Tempo presente demente inconsistente reticente digita-se na ponta dos dedos

minha identidade é minha assinatura não minha senha é carta não email

ultrapassado sou

 

Não tenho a soberba de declarar-me

escritor poetador romanceador

seja lá o que for

Palavras são escorregadias

aceitam bocas correntes não aceitam correntes

abraçam sem pudor os complacentes os coniventes

os dementes e os inocentes e os indecentes

Bobo onde for esqueceu preposição encontrou imposição

Bobo se você não entendeu palavra nem eu