(PROF.:LUIZ CLÁUDIO JUBILATO)
Ruas vêm, ruas vão. Os passantes tropeçam nos seus próprios calçados, nos vãos. Nos pedaços de calçada, nos desníveis, nas poças d’água, nos pedintes, nos vendedores de falsidades, nos proxenetas travestidos de gente.
Passageiros enfrentam-se do queixo para baixo. Os homens olham para trás, as mulheres visam e desvisam os olhos sempre para frente. Guerra. Ombro a ombro. Balé de mancos: um pra lá; dois pra cá.
Passantes passageiros espremem-se entre a parede e a sarjeta. Emburrecidos, nem se viram emparedados; equilibristas, põem um pé aqui, outro ali; um na calçada, outro no asfalto. Roçam nos outros. Não se olham. Não se veem. Nunca se sentem. Jamais se sentirão.
Engenheiros quebram as ruas com as esquinas. Nelas penduram a cangalha entre os postes. Todo gado tem de olhar pra cima. Para os lados. Para frente. Pra trás. Firmar o corpo pra não ser empurrado. É a regra, a lei para os boçais.
A cangalha amarela avisa: “Olha! A morte é vermelha. Pare. Pense. Está à espreita no corpo parado ou nos riscos de pneus no asfalto; a liberdade é verde, pode ser mera ilusão. Andar guiado por sinais. Prisão. Algemas invisíveis. Muletas. O vermelho projeta a grade por trás dos olhos, é sangrar; O verde é a esperança. Quebra os grilhões. Nos tira da inércia. Será?
Quantos sacrificaram vidas avançando; quantos a mantiveram ao parar? Quantos morreram parados; quantos escaparam ao se projetar? A necessidade nos obriga a seguir. Cumpriremos. Temos de engolir qualquer competidor. Deglutir um opositor. Carregamos o cabresto. Estamos armados de impaciência, suor, desejo, metas, distância. Querem nos adestrar os gurus de gestão, os chefes de setor, os comensais. Estamos debaixo do relho. Gemeu, está fora. Despedido. Mandado embora.
Senho franzido. Corrida suada. Olhos fixados na presa. Impregnados das incertas certezas. Temos de seguir os manuais para resolver irresolutas questões. Há uma bíblia guiano nossas atitudes, encarcerando em mandamentos também em tópicos nossa inensatez, nossa lucidez, nossa estupidez.
Somos passantes passageiros como que na janela de um trem. Passageiros no guichê de uma rodoviária. Passantes no eterno check in do aeroporto. Por um segundo, nos encontramos, nos percebemos, nunca nos sentiremos, mesmo se a máquina parar. Seres máquinas. Escolha própria. Pessoal.
Passantes passageiros carimbados com o fedor na pressa da cidade que borbulha, anestesia, estupra, consome, violenta. Nós um dia sairemos dela, ela, com seus nós, jamais sairá de nós.
Ruas, seus vãos, uns os veem, outros desvãos. E todos nós habitamos nossos corpos, as mentes dos outros. Que nos desprezam. Que nos amam. Que nos querem dentro de si ou não. Estamos sós, com nossas saudades, desejos, medos, construções. Queremos o mar. Queremos a terra. Queremos a segurança. Queremos voar. As vitórias não nos redimem, as derrotas também não. Carregamos conosco nossas carnes já sustentadas por nossos ossos. A vida é mera condição.
Estamos estacados na esquina. Cidade quebrada. destinos quebrados, senão emaranhados. A prisão ou a libertação não interessam. Ignoramos o verde e o vermelho. Esticamos a mão. Gritamos: táxi!!! Cheio. O condutor finge não nos ver. A nossa existente inexistência à beira da calçada. Não é um corpo, mas mera mão.
Se vazio, o condutor pára para saber se , do nosso destino, se dignará a participar. Olha os nossos trajes, afinal correspondeu somente ao nosso sinal, ao nosso anseio. Somos apenas agora a nossa mão. Abre os dentes sem simpatia. Somos agora a carne apenas para preencher o estômago do vazio. Sustento. Nada mais.
Os dias são assim enfim: táxis param ou avançam obedecendo a sinalização. Cheios de vida, não param para ninguém. Carregam os protagonistas das prmessas. Das comédias, tragédias, séries de possibilidades. Os vazios procuram nas calçadas os coadjuvantes, diretores dirigidos, roteiristas de bares soturnos onde escrevem todos os dias o roteiro da sua cultivada também adubada solidão.