FIFALDINOS SÃO TUDO, MENOS HUMORISTAS
(LUIZ CLÁUDIO JUBILATO – 23/1/2014)
Todo mundo já desceu o pau na Copa do Mundo: oposição, sociólogos, arqueólogos, jornalistas, economistas e até sexólogos, (estádios são um inesgotável reduto sexual. Todo mundo encoxa todo mundo nas filas. Nas arquibancadas, há um interminável rela rela, muita mãozinha boba na comemoração do gol. Há recantos fantásticos atrás de pilastras largas ótimos para um “amasso”, mesmo de torcedores rivais que se odeiam por amor e vice versa. Não há os filhos do carnaval? Agora, então, haverá os “filhos” da Copa. Já vou dizendo, pra ninguém se iludir: “usem camisinha”. Caso nasça um rebento, não há escolas, nem hospitais construídos nem para eles, nem pra ninguém, só para o Ronalducho. E isso não é gozação. Não há Novalgina, nem maca, nem médicos cubanos.
Recuso-me a falar de Copa do Mundo, porque os políticos, empreiteiras, “asneiras” a defendem com unhas, dentes, discursos suados, afinal dá pra aguentar o calor de Natal usando terno e gravata? E depois dizem que nossos políticos não são verdadeiros heróis. Imagine, como será, na inauguração da Arena Pantanal, na Arena de Manaus! Por um suborninho extra, são capazes de topar até desfile, fantasiados de garimpeiros invasores, por uma tribo raivosa insuflada pelo INCRA contra a demarcação das terras indígenas.
Pra que falar de Copa do Mundo? Porque depois que Dilmão deu um chute na bola, inaugurando a Arena das Dunas, com seu salto de alguns milhares de dólares, resolvi não falar mais desse tema. Daí pra frente, tudo pode acontecer, até mesmo o senador Matar Asnos Suplício fazer discurso sem que a platéia entediada fuja por trás das cadeiras ou fique sonolenta fingindo ouvi-la, depois de receber de novo seu “inovador” plano de renda mínima. Até Sir Ney e Roseana e Renan e Lula e… se fantasiarem de honestos e desfilar com uma placa pendurada no pescoço escrito, “estupradores” (do povão), num presídio de segurança máxima com a bíblia na mão.
A Copa do Mundo não me interessa. O que me interessa mesmo é saber quantos milhares de dólares ou euros as empreiteiras ganharam para fazer o penteado da presidenta? Quem é o heróico mestre de obras capaz daquela proeza? A qualidade da argamassa que os pedreiros e pintores usam pra fazer as rugas dela desaparecerem? O meu interesse é grande e vocês verão como é importante: estou construindo uma casa e preciso desesperadamente saber disso para usar, se não for tão caro quanto a hora dos profissionais que esculpem aquilo. Já viram a foto dela sem a argamassa? Agora, lapidada pelas empreiteiras e pelo Planalto, até que ela não assusta. Leve em consideração algo mais importante ainda: naquele telhado, não vaza a chuva.
Não quero mesmo falar de Copa do Mundo. Prefiro falar do discurso da Dilma em Davos. Lá ela disse pela milionésima vez que faremos a copa das copas. Só não disse quem fará o banheiro dos banheiros e qual fifaldino puxará a descarga, por onde descerão nossa dívidas e nossa burrice. O ministro dos esportes (Só se for de cuspe a distância) Aldo Rebelo, que insiste em parecer vivo, afirmou, sem convencer ninguém, que os estádios ficarão prontos. Ele só não tem a voz de tenor da presidenta, num sua fleuma. Segundo ele, com aquela inegável pinta de garção de filme de terror, a copa deixará um grande legado ao Brasil. Devia, na verdade, deixar um delegado pra prender essa corja toda ao abrir a caixa preta desse mostrengo transformado em doze elefantes, nenhum branco. Todos sujos de falcatruas.
Não admito falar de Copa do Mundo, porque detesto levar puxão de orelhas. Nem minha professora do primário, nem minha mãe cometiam tal delito. O secretário geral da FIFA, Jérôme Walcke, teve a pachorra de puxar orelhas indiscriminadamente de políticos e população por causa da nossa enorme incompetência para contrair dívidas. É verdade, somos incompetentes mesmo, ele tem razão. Ninguém cuspiu nele ou lhe jogou um ovo podre ou lhe deu um chute na bunda. Não aprecei ninguém para expulsá-lo algemado para o buraco de onde deve ter saído com os ratos. Nossa presidenta fez de conta que não era com ela, saiu pela porta dos fundos e se mandou para Davos fazer turismo, afinal é um lugar onde passa totalmente desapercebida, porque ninguém a leva a sério. Se eu fosse ela, faria a mesma coisa, deve ser um porre ser presidenta do Brasil. Nas noites insones, deve contar historinhas do sapo barbudo para os netinhos. A preferida deve ser a do sapo “mui companheiro” que a levou a entrar nessa roubada de ser mais uma vez torturada, só que agora pela FIFA e o honestíssimo congresso nacional.
Prometo jamais falar de Copa do Mundo, porque levar quieto um “sabão” do nobilíssimo senhor Jérôme Walke é duro, hein!!! Me intriga porque esse senhor ainda não foi preso pela INTERPOL? Será por que o Brasil não tem acordo de extradição com o presídio da Papuda? Falei besteira, lá é um perigo ele entrar, pois aprenderá alguns truques com a cambada presa lá. Haja falta de culhões! Somos um bando inegável de bundas moles, um bando inesgotável de idiotas. Por isso mesmo, a quadrilha do Obama entra e sai daqui, contrabandistas entram e saem daqui, porque não estamos nem aí. E ainda cospem na nossa cara.
Que Copa do Mundo, que nada! Vou lançar a campanha: “Salvem nossos dois neurônios, o tico e o treco”. Por quê? Porque não entendemos mais as piadas. E isso tem uma razão: desconfio que Jérôme e Aldo orquestraram um diabólico plano para ajudar nossos já ultrapassados e falidos partidos políticos a não entrarem com pedido de concordata. Ninguém mais dá a mínima para as suas trapalhadas. Ficou velha a velha frase: “Enquanto houver políticos, não precisamos de humoristas”. Já somos uma piada pronta. Pergunte a uma agência de risco se ela aconselha alguém a arriscar investimentos no Brasil. Ela corre o risco de matá-lo de tanto rir. Enquanto isso, parem de rir, o investimento que mais cresce é o de emprestar dinheiro a um governo corrupto, através da poupança, e depois sair em passeata pelas ruas querendo acabar com a corrupção. Só no Brasil!
Na Copa do Mundo no Brasil engendraram um plano contra o humor sério. Você não acha que europeus vêm pra cá ver jogo? Na verdade, vêm curtir o exotismo da favela, tomar caipirinha, “pegar” nativas e encher a cara de carne em churrascaria. Sabem que, se pagarem bem, não estamos nem aí. Se não pagarem, roubamos. Já andam com a gorjeta do ladrão. Desconfio que esse plano diabólico consiste em acabar com a classe dos humoristas esgotando seu estoque de piadas. Querem também confundi-los, principalmente, com a velocidade da produção das patacoadas. Todas as piadas, que parecem novas, parece que já foram contadas, e novela repetida não dá IBOPE. Basta surgir um absurdo e nem dá tempo de contá-lo, porque, em seguida, vem outro. Já vi humorista desistindo da profissão para virar dublador de humoristas ou até virarem padres, para se penitenciarem das piadas racistas, escatológicas ou coisa assim… passamos a nos levar a sério. Achamos que temos consciência crítica. Piramos. O humor nos libertaria das grades que não vemos.
Falar de Copa do mundo, pra quê? A última do “grande”, um metro e noventa, secretário fifaldino, Jérôme Walke, e do seu “pequeno” algoz, Joseph Blatter, que disputa com ele, cabeça a cabeça, bolso a bolso, para ver quem será mais processado em mais países, foi uma para matar de rir: afirmam que não têm medo de protestos, porque o preço dos ingressos é muito alto, por isso não haverá nada fora do protocolo dentro dos estádios. O povão não tem a mínima chance de ver os jogos. Agora, prestem atenção, porque essa é ainda melhor: esquecem que os protestos não são feitos dentro, mas do lado de fora dos elefantes. Partidas correm o risco de acontecerem sem público. Os torcedores ricos podem não conseguir entrar. Assim daríamos uma lição ao mundo: não somos incompetentes, não tão trouxas assim.
Michel Platini disse sob protesto que, com protestos, não vem aqui arriscar a vida. Menos um fifaldino. E os humoristas ainda acham que têm alguma chance contra políticos brasileiros, Blatter, Walcke, Lula e sua corja. E ainda faltam as olimpíadas, hein!
Língua na Tevê
Por Prof. Luiz Cláudio Jubilato – diretor do Criar Língua Portuguesa e Redação
21/01/2014 – Nesse artigo, vou mexer em “vespeiros”, a eterna discussão entre:’a “Língua culta” x “Língua Popular”; gramáticos x linguistas. Quero expor alguns fatores para elucidar o caminho que pretendo trilhar. José de Alencar, por incorporar termos da língua portuguesa do Brasil e seus regionalismos às suas obras (Iracema, Til…), quando era comum imitar o idioma da metrópole, foi acusado por Franklin Távora e outros de escrever “errado”, além de “construir um sertanejo idealizado”. Hoje, é reverenciado como o primeiro romancista autenticamente nacionalista e o legítimo fundador do romance brasileiro. Saudado pela sua “coragem”, “seus erros” encontram-se enclausurados em dicionários e livros didáticos.
Manoel Antônio de Almeida (Memórias de um Sargento da Milícias), Lima Barreto (Triste Fim de Policarpo Quaresma) foram, em suas respectivas épocas, ridicularizados pela “pseudo intelectualidade tupiniquim”, porque, ao escreverem suas obras, abusaram do falar do “homem comum”, morador dos subúrbios cariocas. Hoje, considerados gênios da literatura, justamente por descortinarem o linguajar e os hábitos das classes baixas, é improvável ler esses subúrbios sem o socorro de um dicionário. todas as línguas são tão móveis dentro da espiral da História, como é móvel o homônimo órgão entre o assoalho e o céu da boca. O popular tornou-se culto.
Por outro caminho, chegaremos a um processo semelhante por outras vias. Guimarães Rosa, (Grande Sertão, veredas) ”cria estórias”, “constrói” e “desconstrói” palavras para extrair da mente, da pele, do suor, do coração, das crenças e descrenças dos rudes “coronéis” e “tropeiros” das Minas Gerais, o que há de mais humano e desumano no seu restrito mundo entre montanhas. Contudo, não é crível que o sertanejo seja capaz de utilizar o vocabulário e as construções frasais tão sofisticadas cultivadas pelo autor dentro do útero das suas estórias. Intelectuais até construíram um dicionário específico para “entenderem” um pouco melhor a sua obra. Erudito para os intelectuais e/ou popular para o povo.
Uma frase arreganha sua forma ver: “O sertão é o mundo”.Graciliano Ramos andou por outro sertão, igualmente rude e restrito, o mundo miserável da seca. No estilo do grande romancista, digladiavam-se o “erudito” e o “popular”. Em Vidas Secas, um narrador culto tenta destrinchar a alma do sertanejo, “quase um bicho”. Profunda contradição com Fabiano, o protagonista, que vivia na dúvida se era um homem ou um bicho. Um narrador igualmente culto mergulha na alma de um atormentado e rude Paulo Honório, protagonista de São Bernardo. Outra contradição, pois Paulo Honório, ex-caixeiro viajante, mal sabia falar. De maneiras diferentes, na obra desses e tantos outros gênios da literatura, o “culto” e o “popular” calçaram suas luvas para boxear.
No Humanismo, os nobres inventaram a tal “inspiração” (toque da mão de Deus) para diferenciar o poeta (poesia palaciana – musicalidade sem instrumentos musicais) do trovador (músico das cantigas fruto da cultura oral). O poeta (erudito) x o trovador (popular). A partir daí, os nobre estabelecem aí o preconceito do poeta contra o letrista, até que, pelo bem e/ou pelo mal, esse preconceito arrefeceu. Que me perdoem se digladiaram pela obra do “revolucionário” Villa Lobos contra o “ortodoxo” Camargo Guarnieri.
Quer dizer, então, que Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Cazuza, Renato Russo (com suas letras sofisticadas) podem habitar o mesmo mundo de “monstros sagrados”, como Drummond, Camões, Fernando Pessoa… Agora, funkeiros, rappers, sertanejos… não. O mundo deles arrasta o linguajar marginalizado das periferias, favelas e sertões. Uma língua vira latas, tal qual a da literatura de cordel….(Quem são: Patativa do Assaré? Azulão? Zé Coco do Riachão? Geraldinho? Mc Catra?…. para os “intelectuais” é impensável ombreá-los com Geraldo Vandré, Belchior, muito menos com Ferreira Gullar, Mário de Andrade, Décio Pignatari, Oswald de Andrade…
Quando falamos dessa eterna luta entre o “erudito” e o “popular”, do “correto” e do “incorreto” dentro da Língua Portuguesa, de que língua estamos falando? Aquela multifacetada? Com todas as cores, odores e sabores, de todas as classes sociais? Ou aquela engessada nas gramáticas, dicionários e livros didáticos? O Museu da Língua Portuguesa foi um espaço criado para congregar essas várias caras, esses vários sotaques, esses muitos dialetos e idioletos. Inaugurado, começou “viajando” pela obra de Guimarães Rosa e hoje “viaja” pela obra de Cazuza. Do “erudito”, romancista/contista ao “popular” poeta/letrista.
No Museu, em cada pedaço, está carimbada a nossa cultura: como escrevemos, como falamos, como somos. Mas, ainda falta, podem usar o veneno para atiçar o vespeiro, O Museu discutir os usos do “internetês”, essa nova forma de comunicação, pelos “blogueiros”, os “Twitteiros”, internautas, em geral. Outro mergulho deveria ser no mundo da imprensa: sua história,suas gafes, seus grandes personagens, mas também no mundo da tevê: suas séries, minisséries, telejornais e telenovelas. As diversas classes sociais estão representadas nelas. A tevê quase todo mundo vê.
A telenovela, querendo ou não, constituiu-se numa marca do Brasil. A adaptação de Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães, autor do Romantismo, percorreu uma quantidade enormidade de países, expandindo nossa cultura, contudo, nunca, nenhuma novela escancarou tanto um debate sobre os muitos Português do Brasil, como “Amor à vida”. Walcyr Carrasco vai do gerundismo de Carlito, ao português macarrônico de Denizar. Caminha da importância dada ao falar “correto” pela contumaz leitora, D. Bernarda, ao “não tô nem aí” dito e redito por Valdirene e Márcia. Carlito, o Dj Delícia, sem estudo, faz confusão indiscriminada entre singular e plural, ao contrário do irmão, Bruno, que estudou Direito, por isso não comete esses “deslizes”. Bruno, estudado, teve oportunidade de trabalho nos mais altos estratos sociais, enquanto Carlito, sem estudo, passou boa parte da novela desempregado. Só se deu bem quando conseguiu espaço nos estratos mais baixos da sociedade que se expressam como ele.
Em uma cena simbólica da nossa visão social, Paulinha diz aos pais, Bruno e Paloma, que foi mal na prova de Português, mas não se importa, porque escolheu medicina e médico não precisa saber ler e escrever. Depois de os pais lhe passarem uma descompostura, afirmou, exaltada, que já lera até DOM QUIXOTE, de Miguel Cervantes. Nesta luta ferrenha entre o “erudito/culto” e o “popular/inculto”, não nos esqueçamos de que a tevê traduziu Guimarães Rosa, Manuel Antônio de Almeida, Machado de Assis, Érico Veríssimo e Jorge Amado, por exemplo, para o “populacho”, viraram minissérie; José de Alencar, Lima Barreto e Jorge Amando, por exemplo, viraram novela. Grandes autores, com seus estilos e sotaques, de forma simples e clara, traduzidos para o “inculto” povo brasileiro.
Dei essa volta toda, para ser “espinafrado” pelos puristas, com todos os possíveis “erros”, para discutir a importância de colocar em discussão, mesmo em uma novela, as diversas “línguas” desse Brasil de fronteiras invisíveis, mas existentes: o Português, de “Anos roubados”, não é o mesmo de ” O tempo e o vento”, muito menos o de “Serra Pelada”, mas é a nossa língua pátria.
Dona Bernarda no meio dos livros
Por Prof. Luiz Cláudio Jubilato – diretor do Criar Língua Portuguesa e Redação
D. Bernarda tem aquele sorriso afável e maroto que só as avós são capazes de portar. As experiências lhe conferem o direito de fazer o que bem entender sem parecerem ridículas. Personagem da magistral Nathália Timberg, em 'Amor à vida à vida', aparece, em quase todos os capítulos, acariciando um livro (de papel, diga-se de passagem), como uma criança travessa. Com seu sorriso da atriz que se misturou ao personagem e não mais sabemos quem é quem, indica-o aos outros. Exibe-o sempre acompanhado de uma convincente síntese.
No folhetim de Walcyr Carrasco, há também um escritor: Thales (Ricardo Tozzi) é o personagem ambíguo manipulador e manipulável, que tentou conquistar Natasha (Sophia Abraão) escrevendo um livro sobre o seu arrependimento ao trair o amor da irmã dela. Nos próximos capítulos, pode provar do próprio veneno. Natasha, volta e meia, mexe com seus sentimentos usando, para isso, um livro. É o conquistador sensível, conquistado pela razão, provando o veneno da traição dos seus princípios, como ocorreu com tantos autores e povos ao longo da história.
Alguma coisa de muito novo e muito interessante acontece nos folhetins da Rede Globo: uma espécie de 'cruzada' em favor do livro. Não há uma novela ou minissérie da emissora em que um personagem não discuta, mesmo que rapidamente, o enredo, os personagens e/ou o autor de uma obra. No folhetim de Walcir Carrasco, 'Amor à vida', há uma profusão de leitores. "Merchan" puro das grandes redes de livrarias, para promover autores de qualidade duvidosa? Poderiam alegar alguns. Pode ser, mas esse tipo de produto não era veiculado em nenhuma circunstância e, além de tudo, poderia ser outro, uma geladeira, por exemplo, um banco… E olhe que o Itaú, tem o projeto Itaú Cultural para levar livros às crianças. Por sinal, muito interesante. Não sou funcionário, nem do Itaú, nem da Globo e, antes que alguém diga, não fui pago para escrever este artigo. O mote dele é, inclusive, a massificação do livro, seja como for e de que forma for é por quem for.
No programa do Faustão, vejam só, há indicações de algumas obras. Literárias? De qualidade duvidosa? Goste-se ou não, ali estão indicações de livros. Jogada de marketing? É claro. Mas, o produto poderia ser outro: sandálias, biscoitos… Algum purista e/ou moralista poderia questionar: por que você trata sempre livro como 'produto'? Para não soar hipócrita. Desde o século XVIII, a burguesia trata as obras de poetas, romancistas, contistas e toda sorte de criadores e pensadores, como produtos. O talento para a venda sempre valia mais que o talento criador.
Sou da opinião de que as pessoas devem começar a ler a partir de um tema que lhes interesse, mesmo que indicado por alguém, vá-la, que esteja interessado apenas em faturar com vendas. Conheço histórias de pessoas que começaram a ler encontrando livros no lixo. É o caso do Otávio César Santana, criador da biblioteca Itinerante do Morro do Alemão. Assim que ela passa, as crianças correm atrás dela. O trabalho é feito por amor e idealismo. Não vende nada.No morro, nasce uma comunidade de leitores. Nem a violência do lugar a inibe.
Luto para divulgar o livro em qualquer lugar. Minha escola tem o Projeto 'Criar Leitores'. O projeto leva livros a praças, pontos de ônibus e outros lugares de grande circulação. Simplesmente os deixa ali. As pessoas os pegam e, pode parecer brincadeira, mas não: elas saem lendo. Rindo, gostando, como se fossem crianças.
No programa do Jô, volta e meia, um escritor é entrevistado. Jogada de marketing de grandes livrarias? Que seja. Mas, poderia ser de um outro produto. Em feiras de livros, não ocorre a mesma coisa? O livro não é um produto? Não é em torno dele e, por causa dele que as pessoas lotam praças, teatros, galpões, centros culturais? Os autores dão palestras. Participam de debates. O objetivo não é expor o autor para que ele venda mais suas obras ou as tire do ostracismo?
Pode-se discutir a temática e/ou a qualidade da obra tanto quanto a do autor, mas é relevante o livro se tornar elemento recorrente nos folhetins da Globo, um grande veículo de massa, a ponto de se tornar personagem. O galã, Cauã Raimond, o Leandro, protagonista da minissérie, 'Amores roubados', não conquista as mulheres mais belas valendo-se de um livro de poemas do pernambucano Joaquim Cardozo?
Roberto Saviano, ameaçado de morte, autor de 'Gomorra' e de 'A beleza e o inferno' vive escondido, protegido pelos carabinieri (polícia italiana), pois seus livros demoliram a máfia italiana. Salman Rushdie, autor de Versos Satânicos, também foi condenado à morte pelo Aiatolá Khomeine, líder do Irã, porque consideradou sua obra ofensiva ao profeta Maomé e "blasfêmia contra o Islã". É a sina de autores que resolveram, à custa da própria vida, mudar um mundo. O livro é capaz disso. A Bíblia não é?
No Natal, não sei se o consumidor, influenciado ou não por essa 'cruzada' global, lotou as livrarias. Foram os únicos lugares em que presenciei longas filas. As bermudas, camisetas, tênis e pijamas, tradicionais presentes, nos famigerados amigos secretos, renderam-se ao livro. Valeu D. Bernarda/Nathália. Seu sorriso encheria de prazer a livraria de Franz (Bruno Gagliasso, em Jóia Rara) e derreteria Os Himalaias. O seu poder de convencimento anda mudando comportamentos.
Se grandes veículos de comunicação e até bancos ajudam a massificar a leitura, se você teve paciência de chegar até aqui, num texto deste tamanho, o mundo, então, ainda tem salvação.