Manchetes escabrosas

(O Boca do Inferno – preso em grave delito. Tentava roubar um ovo de Páscoa

16 de abril de 2017

São 10 horas do domingo de Páscoa e foi colocada em prática a operação OVO DE OURO.
Algumas ocorrências foram registradas. A polícia foi acionada, mas não instaurou qualquer inquérito, nem prendeu qualquer pessoa, porque vários dos seus membros foram levados coercitivamente por meliantes mirins até os Supermercados, onde ficaram aprisionados entre gôndolas de promoções de ovos:

1. PAI INDEFESO: Um senhor barrigudo e bigodudo, provavelmente um pai indefeso, foi levado coercitivamente por um pequeno meliante até uma gôndola de um famoso SUPERMERCADO. O meliante mirim queria, porque queria, um ovo. Na verdade, todos os ovos. Usava um arsenal de táticas de tortura psicológica, tais como gritar, pular, chorar e ameaçar para obrigá-lo a comprá-los, ao que ele resistia heroicamente. Vendo outras crianças usando os mesmos métodos, o meliantezinho chamou-as para formarem uma quadrilha lacrimejante e sofrida, soltando berros estridentes. Eram os “Ovoloucos”. Ninguém foi preso por formação de quadrilha ou tortura psicológica, porque exprimidos, entre o bolso e as gôndolas também, os policiais aprisionados resolveram ceder às exigências de membros da quadrilha.

2. PRISÃO DE VENTRE: Diante da prisão sumária, sem direito à defesa, por um pequeno meliante catarrento, uma senhora subversiva, ainda não identificada, tomou das mãos do promotor de uma gôndola um megafone para fazer um protesto contra o SUPERMERCADO. Usou palavras ofensivas, como: ESSES PREÇOS SÃO UM ROUBO, no que foi seguida, aos berros, de “MÃES UNIDAS JAMAIS SERÃO VENCIDAS”. Brandindo armas, como bolsas, talões de cheque e cartões de crédito exigiam do gerente do SUPERMERCADO, que tomasse providências enérgicas para baixar os preços. Com os braços cruzados, ele não se moveu, resistiu heroicamente, como se não fosse com ele. Fez cara de coitado, mas não apresentou justificativas para defender seus patrões da acusação de “roubo” qualificado. Policiais, agarrados e arrastados por seus filhotes, com medo de eles arrebentarem de tanto chorar, ficaram pasmos, mas fizeram de conta que não era com eles e continuaram sua peregrinação “torcicológica”. Sem a reação do gerente, com os ventres exprimidos entre uma senhora gorducha e uma gôndola, decidiram não lavrar a ocorrência.

3. IMPRENSA IMPRENSADA: Sorridentes coelhos pendurados faziam promessas de campanha: Minha marca possui preços mais em conta. Minha marca produz chocolates de grande qualidade. Minha marca, ao contrário das outras traz brinquedos dentro dos ovos etc. Compradores relataram aos jornalistas propagandas enganosas: Ao invés de “compre um ovo e ganhe um brinquedo de brinde”, deveria ser “leve um brinquedo e ganhe um ovo de brinde”. Os jornalistas não esboçaram reação, porque também se encontravam reféns de meliantezinhos que apontavam para os brinquedos e choravam esticando os braços para os céus na esperança de que um ovo caísse. Era de dar pena.

4. COELHO INUSITADO: Na Páscoa, fato controverso, coelho bota ovo, por isso, diante do fenômeno inusitado, comerciantes usam e abusam de colocar preços escorchantes nos ovos. Afinal, galinha põe ovo todo dia; coelho, só uma vez por ano.

5. TORTURA: Para piorar, há tortura declarada contra o pequeno serzinho humaninho. O pequeno animal é obrigado a botar ovos de chocolate muito maiores que ele. Essa mutação genética traz grande aflição para as crianças e grande desespero para os pais, obrigados, que são, a arreganhar os bolsos e despender altas somas, mesmo sofrendo com a crise econômica, para manter o bichinho para o próximo ano.

6. FATO COMPLEXO: A senhora, que acompanhava o garoto e o senhor preso pelo braço por um pestinha, acusado de pão duro pelo pequeno agitador da ordem familiar, propôs uma solução cabível para ambas as partes, diante do fato: ir a outro supermercado, procurar preços mais baixos, no que foi desencorajada por outra senhora de cabelos grisalhos, cujo neto usava métodos semelhantes de persuasão. O ofendido apresentou queixa à mãe, porém ela já não quis ouvir, porque já o colocava no colo e tentava convencê-lo, pelo menos, a comprar o mais barato, que, por si só, já se apresentava caro. Inclusive, agia em causa própria, abria a bolsa prestes a cometer um delito lesa-fedelhos: usufruir de um naco do ovo do filho.

7. FATO IMPORTANTE: Até o momento, não há mortos e feridos, apenas senhores desolados, mães revoltadas, apresentando pequenas escoriações em braços e pernas. Algumas palmadas e berros foram ouvidos, mas nenhum ser humaninho apresentou queixa.

8. CUMPRIMENTO DO DEVER: Para manter a ordem pública, a polícia evadiu-se rapidamente do local, para atender a um chamado: enfrentar um político traficante de ovos no Morro da Macaca.

Acredita-se que, pelas imagens colhidas pela câmera escondida no carro, que policiais receberam propina na forma de ovos embrulhados em papel laminado cor de ouro, para que não interferisse na sua operação caça-votos.

O traficante morreu atacado, atropelado, amassado, agredido pela massa insurrectas mesmo assim. Faltaram ovos para muitos.
Eh! Os ovos de Páscoa estão pela hora da morte mesmo.

Por Luiz Cláudio Jubilato. Educador e diretor do Criar Redação. Professor e especialista em Língua Portuguesa e especialista em vestibulares. criarvest@uol.com.br

 segunda-feira, 17 de abril de 2017

Não entendo mesmo

(O Boca do Inferno – Direto do bolso de um safado qualquer)
15 de abril de 2017

Meus caros, ponderem comigo:

Se todos os denunciados por corrupção afirmam, entre quase lágrimas e quase riso, diante dos microfones ou correndo deles, que apresentaram todas as contas e doações das suas campanhas eleitoreiras ao Tribunal Superior Eleitoral, que as considerou corretas e as aprovou, mas elas não estão corretas e, portanto, não deveriam ser aprovadas, já não passou da hora de investigar o Tribunal Superior eleitoral? Alguma coisa não está funcionando. Hoje saiu a notícia de que o STF não tem estrutura para julgar tantos processos. Seria isso?

Ah! Mas existe o caixa dois. Todo mundo sabe que ele existe desde antes da invenção do Código de Hamurábi. Não criaram nenhum mecanismo de investigação. Isso parece brincadeira, então.

Você diria, desconfiado leitor: “Não cabe aos juízes investigarem”, no entanto cabe a nós, idiotizados e perplexos eleitores, pelo menos, suspeitar, já que andamos suspeitando até da fidelidade do nosso cachorro. Alguns andam correndo em direção ao osso maior.

A democracia não funciona assim, o cidadão não tem o direito de perguntar? Ou ainda estamos, como sempre estivemos, numa “democratura”?
No Rio de Janeiro, a “Operação Quinto de Ouro” (quem é o sujeito que dá nome a essas operações?) pegou de calças arriadas o presidente, quatro conselheiros e um ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ), na gestão Sérgio Cabral.

Desculpem a minha ignorância jurídica: quis apenas perguntar.

Por Luiz Cláudio Jubilato. Educador e diretor do Criar Redação. Professor e especialista em Língua Portuguesa e especialista em vestibulares. criarvest@uol.com.br

 segunda-feira, 17 de abril de 2017

Hoje

(O Boca do inferno – direto de hoje)

14 de abril de 2017

Hoje acordei poético.
Vi as primeiras notícias do dia.
Estou sentado, para não cair, lendo as primeiras listas de chamada dos políticos do dia.
Disse-me o raivoso Ferreira Gullar: Não há vagas / O preço dos ovos de Páscoa / não cabem no poema. / O preço do bacalhau / Não cabe no poema. / Não cabem no poema / a inflação e a manipulação… (tens razão Ferreira, não cabem nem a empulhação, nem o cinismo, nem a corrupção – deu rima, Ferreira!, viu? Mas foi rima pobre).

Dorival cantou com sua voz macia, porém lúcida, nos meus ouvidos quase moucos: Eu vou pra Maracangalha / Eu vou / Eu vou de chapéu de palha / Eu vou… (não sei onde fica Maracangalha, mas nesses tempos bicudos, melhor ir com Dorival. Vai que a operação Lava-Jato vira inquisição: Se Anália não quiser ir / Eu vou só / Eu vou só / Se Anália não quiser ir / Eu vou só – mas fique tranquila Anália, pagarei pensão alimentícia).

Bandeira me disse em tom ingênuo, desconhecedor do feminismo e da policalha desses tempos bicudos: Vou-me embora pra Pasárgada / Lá sou amigo do rei / Lá tenho a mulher que eu quero / na cama que escolherei… (não é bem assim, Manoel – ser amigo do rei é uma roubada, ele pode parar nas mãos do Sérgio Moro e, se a Odebrecht construiu o castelo, ele fará delação premiada e você pode ser arrolado como operador do sistema de caixa dois – muito menos terá a mulher que quer, na cama que escolhe: isso é machismo. E se você escolher a cama e ela não quiser aquela? Ela escolhe a cama e a hora. Acredite, Manoel, é melhor assim).

Acho que vou seguir meu próprio poema, apesar de hipócrita: Vou-me embora pra Machu Picchu. Lá não tenho amigo, nem rei / lá não há politicagem / nem coisa que não sei…

Lá posso, sem problemas, posso praticar os versos de Adoniran Barbosa sem ter que votar em nenhum estatuto sobre o desarmamento: Nervoso pegarei a arma e praticarei para não ser mais assaltado na “taubua de tiro ao Álvaro” / não tem mais onde furar… / teu olhar mata mais que Bala de carabina / Que veneno estricnina / Que peixera de baiano / Teu olhar mata mais que / Atropelamento de automóvel / mata mais que bala de revólve.
Melhor parar de poetizar.

Daqui a pouco minha auxiliar de serviços gerais colocará o bacalhau na mesa.
Não falo “empregada”, porque o vocábulo pode sugerir preconceito de classe e eu não quero ser preso por discriminação.

Boa Páscoa, apesar de eu ser ateu.
Tá vendo, acordei tão poético hoje!
Vou ler um Brasil “Claro Enigma” à tarde. Drummond e o mundo que me aguardem.

Por Luiz Cláudio Jubilato. Educador e diretor do Criar Redação. Professor e especialista em Língua Portuguesa e especialista em vestibulares. criarvest@uol.com.br

 segunda-feira, 17 de abril de 2017