A UM PASSO DA FUVEST
(Professor Luiz Cláudio Jubilato – coordenador geral do Curso Criar Redação – consultor para vestibulares)
O grande problema da Fuvest é ser essa sigla. Se se chamasse “bagaça”, a conversa seria outra. O mito cairia pelas tabelas. O medo é muito maior que o fato: você já fez provas muito mais difíceis que a da Fuvest e “nem se tocou”.
A grande diferença entre esse vestibular e os outros é a mística criada em torno dele, além do fato, lógico, de ser o vestibular mais concorrido do país (pra que fui falar isso?). Só que é concorrido para todo mundo. O medo que você tem do seu concorrente é o medo o mesmo que ele tem de você (acorde). “Se você tem medo de perder, já perdeu”. Está cansado(a). Primeira pergunta: “Quem não está?”. Segunda pergunta: “Alguém disse que seria fácil?”. Se disse, é uma pessoa que gosta de você.
Vamos largar essa conversa fiada de “dar porrada em um travesseiro para diminuir o estresse”, “gritar para acabar com o estresse”, “beijar ou abraçar ou os dois juntos para acabar com o estresse” e ir direto ao que você quer (AVISO DE DICÕES):
1. Temas atuais, como racismo, emponderamento, podem aparecer em questões de filosofia, história, literatura.
Lembre-se:
a) Emponderamento: Rita Baiana (meu corpo, minhas regras); Leónie e Pombinha (homossexuais) em O Cortiço; Ondina (meu corpo, minhas regras) – em Mayombe.
b) Racismo: escrava Bertoleza – morre para salvar o casamento do João Romão (Cortiço); Prudêncio – que serve de mula para Brás Cubas e depois, alforriado, reproduz o comportamento dos brancos (Memórias Póstumas de Brás Cubas); Helena Morley sofrendo com a condição dos escravos, que passaram a ser “alugados”. (Minha vida de menina).
b) Xenofobia: Jerônimo “abrasileirou-se: abandonou os costumes portugueses (chá, vinho, fado, trabalho) para abraçar a brasileira (café, cachaça, samba, vagabundagem); portugueses brigando contra brasileiros (O Cortiço).
c) Ilhamento: guerrilheiros são náufragos (Mayombe); A família de Fabiano (Vidas Secas).
d) Revolução pelas armas: guerrilheiros do Mayombe; Fabiano queria ser cangaceiro;
2) Todos os contos de Sagarana têm o mesmo tema: “Todo mundo tem a sua hora e sua vez”:
a) luta do bem contra o mal (Manuel Fulô batizado / Targino – pagão).
b) As parábolas: Traços biográficos de Lalino Salãthiel (marido pródigo); A hora e a vez de Augusto Matraga (Matraga entrou no céu a porrete)
c) A natureza é personagem da obra (Sarapalha); o vaqueiro Viriato ensina o narrador as artes do amor (Minha gente).
d) O mal intrínseco, incontrolável (O boi Calundu em O burrinho Pedrês, Targindo em Corpo Fechado); Matraga (A hora e a vez de Augusto Matraga).
e) Joãozinho Bem-bem é um nome irônico (parece nome de criança, mas não é – o mal está alojado dentro dele; Bem-Bem é uma onomatopeia); faz o “bem” duas vezes a Matraga (quando lhe dá uma arma e Maraga descobre o mal em si e quando luta com ele e morre como herói épico); Matragga (Mal Traga = trazer o “mal”).
f) Fábulas: O burrinho Pedrês; Conversa de bois.
g) Neoplatonismo em Minha gente: Maria Irmã (amor espiritual); Armanda (amor carnal); o narrador jogo de xadrez. mas não entende o jogo de xadrez do amor.
h)Todos os personagens principais dos contos encontram a sua hora e a sua vez (momento epifânico), todos fazem uma “travessia” em busca do autoconhecimento;
i) Obsessões de Guimarães pelos olhos: Luísa = olhos duros (Sarapalha); Silivana (olhos de cabra vesga), Maria Irma (olhos doces);
3) Obras multiculturais: Mayombe e Sagarana;
4) Heróis épicos: Sem Medo (Mayombe); Manuel Fulô (corpo fechado);
5) Mayombe tem um narrador em 3a. pessoa que se identifica só no final da obra (João – comissário); narradores em 1a. pessoa (a cada um momento um guerrilheiro).
6) Mayobe: Para TEORIA, o mundo era maniqueísta – filho de negra e branco (café com leite, mulato) queria ser o “talvez”, a dialética.
7) Drummond: Claro Enigma (O mal dos enigmas é que eles não se decifram a si mesmos); Permutando as letras de Iracema, chegamos a América; Permutando as letras de Claro Enigma (acrescentando um S), temos Carlos Enigma (Drummond é o grande enigma da obra).
8) Árvores com simbologia especial (Jatobá – Iracema – amizade e o coqueiro, onde o vento batendo diria o nome de Iracema); (Amoreira – Mayombe – onde Sem Medo é enterrado).
9) Iracema: batismo de Poti e Jacaúna os seus feitos ainda maiores; o batismo de Manuel Fulô torna o seu feito ainda maior.
10) A MALEITA, MALÁRIA ou CEZÃO é doença endêmica em MG.
QUEM SE IMPORTA?
LIVRARIAS fecham. BIBLIOTECAS vivem às moscas.
Sofro de duas doenças incuráveis: saudosismo patético e indignação imbeciloide. Aposto na utopia, contudo enxergo a distopia. Tecnologia é bom e é ruim. Tecnologia é camaleão.
Quando os discos de vinil deram lugar aos toca-fitas, senti calafrios. A arte das encadernações fantásticas sumiu. Um idiota da praticidade me disse que era o progresso, assim preservaríamos melhor as florestas. Lojas e mais lojas faliram. Algumas, para sobreviver, incorporaram as batatas.
Quando os livros de papel deram lugar aos e-book, não são apenas as traças que perderam o emprego, os artistas das capas e encadernações também. Um idiota da praticidade me disse que assim preservaríamos melhor as florestas. Livrarias estão fechando e, muitas, para sobreviver, incorporam as batatas.
Quando as salas de cinema dos shoppings chegaram, os alicerces das salas urbanas tremeram. Com as plataformas streaming, ninguém mais precisa ir a lugar nenhum, para assistir a um filme. O eu sozinho matou o só na multidão. Algumas redes de tevê, para sobreviver, vendem batatas.
Quando uma livraria fecha, morremos um pouco mais. O antigo ocupa espaço e tem cheiro de calçamento. O novo desocupa o espaço e tem cheiro de asfalto. O fechamento deixa um vazio imenso, não só um buraco dentro de portas cerradas.
Quantas pessoas perderam seus empregos, por causa desse necessário progresso? Quantos milhares de salários deixaram de ser pagos? Quantos deixaram de girar a roda da vida? Progredir dói. Pessoas são capazes de matar por batatas.
As bibliotecas também estão às moscas e, daqui a pouco, perderão o sentido, tanto quanto as cartas, a escrita cursiva (nossa identidade), as notas, os nomes de ruas, praças e avenidas (a identidade da nação). A digitação, o cartão de crédito, o spotfy, o e-mail são como plásticos cheios de bolhas: é uma delícia estourar cada uma. Há ar comprimido apenas. Estão aí para também não ficarem.
Somos um país em que não se lê quase nada e livro é caro. A elite prefere comprar uma calça jeans. Coitada! Ela crê que se lê um livro apenas uma única vez. No mundo da palavra, não as incorporamos, simplesmente porque não as conhecemos. Obrigar alunos a lerem livros para fazer provas é usar a literatura como instrumento de tortura. Escolas, professores e bancas examinadoras são co-responsáveis pela falência do ensino e das livrarias e pelas baratas nas bibliotecas.
Há momentos em que o passado dói como uma ferpa enfiada no dedo. Desculpem: hoje se usa MDF, granito, azulejo e madeira tratada. Não há mais lugar nem para ferpas, nem para para a saudade patética, só para as florestas destruídas e as batatas.
PAI
Sempre poema, nunca dilema
(Luiz Cláudio Jubilato – pai)
Num belo dia de sol, minha mulher me entregou um menininho de presente que carregava os traços dela e os meus também.
Não andava nem falava, mas mandava nas nossas vidas, nas nossas noites, nos nossos momentos e na nossa casa também.
Meu mundo girava em torno dele e do dela também.
Um dia ele disse “eu te amo”. Ela o aconchegou nos meus braços, riu do meu jeito desconcertado, e, no meu amor por aquele serzinho, amadureceu sua fé.
E eu que estava de joelhos, com medo de ele cair, deixei esse medo no chão, criei coragem, me fiz mais homem, pai de verdade, e me pus de pé.
Num belo dia de sol, ela me entregou uma menininha, que sorria o tempo todo, pedindo colo para mim.
Seu sorriso carnudo e seus cabelinhos encaracolados se tornaram também parte de mim.
Cada tropeço doeu muito nela, mas doeu muito mais em mim.
Um beijinho dela fazia parar o tempo, para todas as vozes do mundo cantarem por mim.
Juntos eles são a nossa força e também a nossa fraqueza.
Juntos eles são nossas limitações, medos, mas aguçam nossa destreza.
São a melhor parte do nosso mundo, perto deles ou com eles no colo não conhecemos tristeza.
Nós os parimos para serem cidadãos desse mundo tão duro.
Terão nossa força, farão sua caminhada, construirão de cabeça erguida o seu futuro.
Cada um educará seu filho e colherá suas vitórias e derrotas, como se colhe um fruto maduro.
Ainda pequeninos, fazem xixi e cocô na nossa roupa e, mesmo assim, nós os amamos. Eles mandam na nossa casa, sujam nossa cama e, mesmo assim, entre risos e brincadeiras, nós os adoramos.
Pais, vivemos o orgulho de ver nos nossos filhos os nossos traços, nos aconchegamos acalentados nos seus deliciosos beijos, carinhos e abraços.
Cada filho levará, nas suas atitudes, a educação que a nossa casa lhe dá.
Carregará pela vida inteira e legará aos seus filhos nossa força, lutas, ideais, inteligência, o nosso DNA.
Evoé cada pai nesse dia de sol.
Mesmo que chova, sempre será sol.
Cada olhar do nosso filho nos aquecerá pela vida ainda mais que o sol.
Cada incerteza dele, será nossa certeza de que, se hoje existe noite, amanhã virá o sol.
Filho, como o milho, nos alimenta, um dia nos traz a luz da lua, no outro dia, a luz do sol.
Para sempre pais, para sempre mais, para sempre raiz, para sempre força motriz. Nunca surdo, nunca mudo, sempre tudo.
Um dia levanta, um dia cai, um dia é filho, noutro dia é pai. A roda da vida gira, assim é, assim será. Num dia, terá os pés no solo, no outro voará. Assim gira a roda vida, existe para ser vivida. Pai é segurança, é ser humano, não é ferida, é sustento para o corpo e a alma, é comida.