NÃO LEIA ESTE LIVRO. NÃO VALE A PENA

(O BOCA DO INFERNO – 3/4/2014)

Meus amigos me questionaram várias vezes sobre um fator deveras preocupante. Mergulhei numa depressão danada. Por causa disso, passei várias noites insones: “O que será de você quando acabarem com esse tal de Facebook? Ou quando censurarem a internet?”

Serei direto/objetivo: “Não sei”. Tenho um medo danado de ficar mudo, de ser “feliz”. Cada texto é um parto. É como parir um abacaxi.
Sei que escrevo textos longos, analíticos sobre temas complicados que, na maioria das vezes, interessam a muito pouca gente ou, de fato, a ninguém. Por isso, aconselho a não ler: Fede.

Começo isso aqui com um “mea culpa” público, pois, covarde como sou, com medo da censura, sei que ficará tão escondido como se estivesse na toca de um tatu: “Sempre desci o pau no ENEM, valendo-me de argumentos torpes, os quais, neste momento considero despropositados ou mesmo imbecis”. Pobres jovens sentados à minha frente, arrepiavam-se quando eu, tomado por “forças ocultas”, vaticinava, no primeiro dia de aula: “De novo, o ENEM não dará certo”.

Diante do exposto acima, quero me ajoelhar perante as autoridades do país que, com a sua perspicácia, criaram essa avaliação tão pertinente. Através dela, conseguiram mapear uma situação que eu, com meus míseros 38 anos de magistério, ministrando aulas de literatura, história da arte, redação, linguagens e códigos, jamais consegui vislumbrar.
Eu preveni: “Fede”.

Os números foram extraídos, parece gozação, da Agência Brasil. O que você verá é a nossa burrice no espelho. A burrice Fede:

Em 2013 o tema do Enem foi ” Os efeitos da implantação da Lei Seca no Brasil”. O aluno deveria apresentar formas de intervenção social para resolver a problemática levantada por esse tema.

Quase 6 milhões de bravos rapazes e moças se espremeram nas filas de entrada dos portões das escolas desse Brasil varonil para responder a 90 testes e ainda redigir uma dissertação sobre o tema no segundo dia, pois idiotas que são, fizeram 90 no primeiro dia! Uma pequena corrida de obstáculos. Corrida sentado não cansa.

O resultado é o que está aí embaixo. Ele suscitará várias teorias pedagógicas e alguns sectários até falarão em conspiração dentro do INEP contra o PT: “Forças ocultas querem destruir a candidatura de Dilma Rousseff”. “Essa oposição desesperada não tem limites” , por vai…

1) Ao todo, foram corrigidos 5.049.248 textos, de acordo com o Inep.

2) Destes, 481 tiveram nota mil.

3) Em branco, foram 32.991 e outros 73.751 foram anulados, totalizando 106.742 redações com nota zero.

4) Desvios gramaticais ou de convenções de escrita só foram aceitos como exceção e quando não apresentaram reincidência no texto.

5) Receberam nota zero, 1.398 redações (0,028% do total) que apresentaram parte do texto deliberadamente desconectada com o tema proposto, segundo o Inep.

Rendo-me às evidências: O MEC acertou no gênero, número e, principalmente, no grau. O ENEM descobre, com extrema perspicácia que o nossa juventude está à beira da imbecilidade total. Fede. Mesmo que quisesse, não leria. Não tem jeito mesmo: um bando infindável de antas baleadas. Para minha sorte, ninguém entenderia esse pequeno conjunto de bobagens escrito por esse asno aqui, caso se aventurasse.
Dar a um jovem um tempo enorme (1h ou menos, depois de ele responder a 90 testes) para redigir um texto sobre porres ao volante é de uma GENIALIDADE IMPRESSIONANTE: atesta inteligência, rapidez, capacidade de empunhar uma caneta, aferir se o indivíduo consegue segurar uma folha de papel etc etc etc…
Você acha que não, mas esse tipo de avaliação é de extrema importância. Confirma, sem sombra de dúvidas, se um jovem dessa tribo de botocudos é ou não um completo idiota.

Não disse para não ler, seu corajoso energúmeno. Fede mesmo.

CONFESSO: eu sou uma “besta”, “uma anta” porque preparo esses palermas para fazer o ENEM.

Ainda bem que ninguém lê isso.

 terça-feira, 06 de maio de 2014