A carne mais barata do mercado ainda é a carne negra

A imagem de uma pessoa negra, presa num pelourinho, exposta ao escárnio do povo e punida por mãos de brancos no tempo da escravidão não choca. Em tempos de preconceitos e arbitrariedades essa cena não choca. Não choca porque a escravidão negra é considerada justificável. Não choca porque grandes senhores disseram que isso é certo. Não choca porque as fazendas precisam de mão de obra gratuita.

Mas e a imagem de uma pessoa negra, desnuda, presa num pelourinho improvisado, exposta ao escárnio e punida por mãos de brancos em tempos não mais de escravidão, em tempos em que o discurso da liberdade, da igualdade e da intolerância ao racismo já foram “consolidados”? Choca? Não choca. E não choca porque espancar um negro que está preso a um poste é tão normal quanto atear fogo em um índio, agredir empregadas domésticas e dar pauladas em homossexuais.

Até quando as pessoas vão continuar agindo de maneira tão absurdamente patética e até quando pessoas que estão na mídia, como a grandiosíssima Raquel Sheherazade, vão continuar apoiando pessoas cheias de energia, não para trabalhar, estudar ou fazer algo de útil (claro), mas para participar de espancamentos no meio da madrugada? Até quando o projeto racista e violento, vigente atualmente, vai continuar dirigindo o Brasil? Quando é que esses tais “vingadores” vão serão enxergados como violadores? Bem… a resposta a essas perguntas talvez, talvez… incomode.

O fato, como bem disse Hélio Santos, é que “hoje, no Rio, se fala em violência, são 400 favelas, o Rio em si já contém essa violência, agora a violência vem atingindo algumas pessoas, mas não há nada mais violento do que o Rio sempre foi, foi a maior cidade escravista do século XIX, a metade da população era escravizada, queria que viesse o que depois? Um paraíso? Uma Estocolmo? Nós temos o que nós plantamos”.

E o que plantamos durante dois séculos de desigualdade e violência não pode ser tratado como trataram o jovem de 15 anos, neste começo de fevereiro, no Rio de Janeiro. O ódio generalizado por um tipo social ou o medo ou a vontade de “justiça” devem ser contidos. Como mostra a história, grupos organizados que se sentem no direito de violar os direitos humanos, que se sentem no direito de julgar algo que cabe à Justiça, só geram mais violência, mais insegurança, mais terror e mais choques.

Rubia Alves

 quarta-feira, 19 de março de 2014