Em sua adolescência, Dioniso, deus do vinho e do teatro, correu o mundo conquistando terras como a Índia e reunindo um grupo exótico de seguidores. Aonde quer que fossem, Dioniso e seus amigos ensinavam os homens a beber e a apreciar o álcool em orgias e danças nas quais os participantes eram tomados de uma loucura frenética. Três mil anos depois, o legado dionisíaco continua vivo e orgias de liberalidades e bebedeiras são realizadas todos os finais de semana por seus seguidores mais fiéis: os jovens.
Os seguidores dionisíacos contemporâneos, assim como os mitológicos, afirmam buscar nas bebidas alcoólicas a diversão, o prazer e a liberdade por elas proporcionados. Está comprovado cientificamente que o álcool, além de trazer danos irreversíveis ao cérebro, é potencialmente capaz de reduzir a ansiedade, deixando os combalidos jovens num frenesi perigoso. Daí a acreditar que uma Smirnoff pode transformar um pacato cidadão em um adulto bem sucedido, feliz e popular, há um enorme salto mediático. Enlatando todas as virtudes socialmente cobiçadas em uma única embalagem de bebida alcoólica, as coorparações dionisíacas da atualidade vendem seus produtos exponencialmente, não se importando em anunciar também que os goles de liberdade podem virar amarras do vício.
Devemos a Dioniso a funesta herança de acreditar que só há uma maneira de diversão, comum a todos do grupo. Se há três mil anos os amigos do deus eram levados a dançar da mesma maneira, hoje são, entre outras coisas, tão benéficas quanto, levados a beber. A verdade é que a bebida tornou-se ícone da aceitação, recebendo, inclusive, apoio de muitos pais. Ora, para um gregário e manipulável jovem, o álcool é a solução, de se não todas, da maioria de suas inquietudes típicas do período. Dessa maneira, rituais dionisíacos reduzem-se a coerções sociais e a manipulação dos mais jovens.
A identidade criada entre os seguidores do deus da orgia é também alvo de interesses financeiros. Quanto maior o grupo de consumidores de álcool, maiores os lucros auferidos. É por isso que apesar de proibido, o acesso de menores à bebida é tão fácil: burlar a legislação é comercialmente profícuo. Além disso, é também graças às pressões midiáticas, que se tornam sociais, que os jovens começam a beber cada vez mais cedo. Ao que tudo indica, o deus Dioniso não passa de uma propaganda para vender mais.
Como o próprio Dioniso pode constatar, é muito fácil atrair jovens alienáveis do que adultos argutos para as orgias. Afinal, aqueles, ao brindarem uma cerveja pela sua liberdade, não percebem que liberdade não cabe em uma garrafa; ao beberem com os amigos, não notam que todos não passam de fantoches, que o prazer não é eterno e que sua saúde está em risco. Realmente, os golpes de liberdade são bem mais saborosos para os mais sensíveis.